Muita gente já ouviu falar que fortalecer o “core” — os músculos do abdômen e da região lombar — é a chave para prevenir ou tratar dores nas costas. Esse conceito se espalhou bastante, mas será que ele é realmente verdadeiro? No fim da década de 1990, alguns estudos mostraram que pessoas com dor lombar tinham atraso na ativação de certos músculos profundos do abdômen, principalmente o transverso do abdome. A partir daí, criou-se a ideia de que “reeducar” esses músculos traria estabilidade para a coluna e resolveria a dor.
O problema é que essa visão é simplista. O corpo é muito mais complexo, e a dor lombar não pode ser reduzida apenas à falta de ativação do core. Pessoas sem dor também apresentam variações na ativação dos músculos abdominais e muitos estudos não encontraram melhora significativa da dor apenas com exercícios focados no transverso ou multífidos. Em alguns casos, tentar contrair constantemente o abdômen pode até aumentar a tensão e piorar os sintomas.
A ciência entende hoje que a dor nas costas envolve diversos fatores: postura, condicionamento físico, estresse, hábitos de vida e até aspectos emocionais. Por isso, não existe um “músculo mágico” que sozinho previna ou cure a dor lombar. Fortalecer o core é importante, mas deve ser visto como parte de um trabalho global de movimento, que inclua exercícios gerais de força e flexibilidade, atividades aeróbicas, treino funcional que integra todo o corpo e estratégias para reduzir o estresse e melhorar hábitos de vida. Ou seja, cuidar do core ajuda, mas não é a solução única nem milagrosa.
A ideia de que existe um “músculo central” responsável por proteger a coluna é um mito científico. O tratamento da dor lombar deve ser amplo, personalizado e considerar a pessoa como um todo. A fisioterapia especializada tem papel fundamental nesse processo, ajudando o paciente a recuperar confiança no movimento, melhorar a força global e retomar a qualidade de vida.
Referência: Richardson C, Jull G, Hodges P, Hides J. The Myth of Core Stability. 2007.